O caiçara Gilmar Pinna construiu e doou a estátua maior que a do Cristo Redentor; conheça a história por trás da obra e outras criações do artista
Gabriela Petarnella
Publicado em 11/10/2023, às 10h27 - Atualizado às 12h15
O escultor nascido e criado em Ilhabela, Gilmar Pinna, é o responsável pela construção da estátua monumental de Nossa Senhora na cidade de Aparecida, em São Paulo, com impressionantes 50 metros de altura, inaugurada no dia 7 passado. A homenagem chamou a atenção do país, pelo tamanho da obra, maior que o famoso Cristo Redentor, no Rio de Janeiro (38 metros).
Escultor de Ilhabela inaugura estátua de Nossa Senhora maior que Cristo Redentor
— Portal Costa Norte (@costanortenews) October 11, 2023
O caiçara Gilmar Pinna, inaugurou no dia 7 de outubro, na cidade de Aparecida, a primeira parte de uma escultura em homenagem a Padroeira do Brasil pic.twitter.com/HPqxFnq4T2
A obra de arte instalada no bairro Itaguaçu está aberta a visitação gratuita, sem restrição de horário. A instalação conta com um show de luzes ao anoitecer e pode ser vista de uma distância de até 6 quilômetros de distância, podendo ser avistada até mesmo da rodovia Presidente Dutra, no trecho que passa pela cidade.
A inspiração para criar a estátua de Nossa Senhora surgiu a partir de uma promessa feita por Gilmar há cerca de 40 anos. Ele desejava se sentir mais próximo de Jesus e, por isso, decidiu homenagear sua mãe, que é a padroeira do Brasil. Mas Gilmar aponta que a promessa ainda não está cumprida. A estátua de Nossa Senhora é apenas a primeira de quatro fases da instalação.
“A única coisa que eu tenho na vida de valor é o meu dom em esculpir e foi Jesus quem me deu. Eu queria alegra-lo e acho que ele deve estar contente comigo agora. Essa estátua tinha que ser grande para representar a grandiosidade da santa, e mesmo assim, ainda ficou pequena perto do que ela representa”, explicou Pinna.
Até o momento, ele trabalhou intensamente por sete anos e ainda planeja mais um ano e meio a dois anos de trabalho para concluir 100% a estátua. A segunda fase incluirá a instalação da forma do mapa do Brasil ao redor da santa, que ainda precisa passar por uma estruturação e fundação com pilares nas laterais. Na terceira fase a criação ganhará dois braços que cobrirão os pilares e que representarão os braços de Deus segurando o Brasil.
A última fase envolverá a construção de banheiros e infraestrutura para os visitantes. Gilmar deseja que o local seja um canto de muita paz, apreciação e ligação com a fé e por isso irá arcar com os custos da estrutura.
O processo até a inauguração da estátua foi turbulento. Em 2019, Gilmar deu início à instalação da obra, porém, no mesmo ano o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) embargou a obra, em decorrência de uma ação de uma associação de ateus que questionou o investimento de dinheiro público em um monumento de cunho religioso. O processo resultou em um atraso significativo de quatro anos, período em que a estátua sofreu pichações e vandalismos.
Neste ano, o TJSP fez a liberação para o retorno da instalação da obra, ao aceitar o argumento de que o turismo da cidade de Aparecida é movido pela religião e que mais um ponto de visitação movimentará a economia local.
Depois deste período, a escultura finalmente foi inaugurada com sucesso. O artista revela que foram momentos difíceis, mas que já se curou do sofrimento e que não guarda mágoas das pessoas que moveram a ação contra a obra.
“Eu acho que eu tinha que passar por isso, foi um aprendizado. Quanto à entidade que fez a denúncia, acredito que pode ter sido um mal entendido e eles podem me procurar para conversar. Eu sofri, mas me curei e espero que eles possam me procurar porque será a melhor forma de entendermos ambos os lados”, pontuou Gilmar.
Mesmo resolvendo essa pendência, o escultor agora enfrenta outro desafio. A poucos dias da inauguração, Pinna sofreu um acidente na obra, ao cair de uma escada e acertar o chão com apenas uma perna como apoio. Isso lhe causou rompimentos no joelho e problemas no fêmur, mas não impediu que ele concluísse a instalação e estivesse presente na cerimônia de abertura do espaço.
Segundo ele, seu médico até se espantou com o fato de que ele não está sentindo dor alguma, mesmo com tantos danos. Mas ressalta que é assim que a fé age na sua vida: “o amor e a fé curam e a cura já está agindo em mim. Meu êxtase e felicidade em dar esse primeiro passo na obra é tão grande, que não sinto absolutamente nada”.
A conclusão dessa primeira fase da obra contou com muito apoio de amigos do artista. O terreno foi cedido por um amigo, o asfalto foi feito por outro, e assim, o andamento foi acontecendo com muita solidariedade. Ele vê a conclusão da estátua como uma vitória e um exemplo de doação e perseverança.
Aos pés da estátua de Nossa Senhora, Gilmar Pinna apresenta uma exposição itinerante chamada Caminho - a vida pública de Jesus Cristo. A exposição contém 50 esculturas divididas em 16 cenas, que abrangem desde o nascimento de Jesus com a Sagrada Família até sua morte e ressurreição.
Nesta obra, a mensagem transmitida pelo artista fica mais evidente. Gilmar aponta que a intenção é destacar o sacrifício de Jesus em prol da humanidade, enfatizando que Ele doou literalmente seu sangue. Portanto, o objetivo é incentivar as pessoas a seguir esse exemplo e doar o que puder, nem que seja água. O importante é estar disposto a ajudar o próximo, com algo que você seja afortunado.
“O que eu quero mostrar para o meu povo, é que a gente dá o que tem. Então, o que eu tenho é a obra de arte, esculturas, e eu estou me doando um pouco, levando a mensagem”, ressaltou.
Aproveitando essa mensagem, Gilmar ainda promove uma campanha que faz alusão ao derramamento de sangue de Jesus, para incentivar a doação de sangue e órgãos, pois de acordo com ele, Cristo doou seu corpo inteiro a toda a população. Ele ressalta que a campanha é importante pois existem muitas pessoas necessitadas e os bancos de doação estão escassos.
Esta exibição ficará instalada em Aparecida até o começo de dezembro e o autor já deixou um recado para as prefeituras do litoral de São Paulo: “gostaria muito de trazer essa obra para cá, estou de portas abertas, principalmente para Caraguatatuba, onde tem o Hemonúcleo que capta e distribui sangue para a região. Pode me contatar pelo Instagram que eu mesmo respondo”.
Ainda na intenção de expandir a ideia de ajuda ao próximo, o artesão caiçara, revela ainda que ser artista no Brasil é difícil quando se tem pouco apoio e que quase não recebe reconhecimento do litoral norte, sua própria região.
Além disso, muitas pessoas parecem não entender o motivo de suas obras e por isso, o criticam constantemente na internet. Mas mesmo assim, o que o faz continuar na caminhada são os momentos de troca com amigos e admiradores, sejam trocas materiais ou de mensagens de motivação.
“Ontem eu recebi uma mensagem de uma mulher de Ilhabela, que eu não conheço, mas que me deixou muito feliz. Ela me disse que sentia orgulho de mim e da minha missão. Eu respondi a ela, que por mais difícil que seja ser artista no país e ainda mais no litoral, eu creio que estou abrindo portas para outras gerações e que talvez lá na frente eu seja lembrado por isso”.
O escultor tem diversas obras por toda Ilhabela, como a escultura Multiplicação que enfeita a rotatória do peixe no bairro do Itaquanduba e também como a Cruz e Cristo que marca a entrada da Igreja Matriz de Nossa Senhora d’Ajuda, na Vila. Mas a mais famosa é a grande exposição fixa Via-Crucis.
As esculturas representam este momento da história de Jesus e inclui na passagem, divindades e personalidades como Buda, Tupã, Ganesha, Amon Rá, Allan Kardec, Zeus, Deusas Wicca e muitos outros, em posição de demonstração de apoio e conforto a Cristo naquele momento difícil.
Já na Praia Grande, o escultor assinou um dos cartões postais da cidade, a Praça da Paz, um espaço com sete esculturas representando personalidades históricas como Sérgio Vieira de Melo, Jesus Cristo, Maria Mãe de Jesus, Papa João Paulo II, madre Tereza de Calcutá, Mahatma Gandhi e Nelson Mandela. Nela, moradores e turistas podem passear ao redor dos jardins e também entrar nas esculturas, que são ocas. Dentro delas existe uma descrição de cada personagem.
Ao todo, as esculturas tem até oito metros de altura e 15 toneladas de aço carbono e ferro. E a cidade tem outras duas esculturas de Gilmar instaladas na entrada da cidade, são elas, os bustos dos jornalistas Roberto Marinho e Júlio de Mesquita, localizados na Praça A Tribuna.
Gabriela Petarnella
Jornalista formada pelo Centro Universitário Módulo. Possui experiência em videorreportagem e fotojornalismo
