QUE BICHO É ESSE?

Verão acende alerta de acidentes com lagartas; veja cuidados e como agir

Algumas lagartas possuem venenos que, em contato com a pele, podem provocar de alergias à hemorragias e, em casos extremos, até óbito

Eleni Nogueira
Publicado em 03/01/2024, às 12h40 - Atualizado às 12h47

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O bicho-cachorrinho é uma das espécies que provocam acidentes - Valclei Lemos / Arquivo CN
O bicho-cachorrinho é uma das espécies que provocam acidentes - Valclei Lemos / Arquivo CN

Verão é tempo de alerta, nas regiões sul e sudeste do Brasil, para acidentes com lagartas, ou taturanas. O nome taturana vem do tupi tatarana, cuja tradução já é um sinal de alerta: tata (fogo) e rana (semelhante). Semelhante a fogo, sim. Pois, no contato com a pele humana, algumas delas liberam toxinas que provocam desde uma simples irritação, ardência, queimação e avermelhamento, até febre, vômitos, e nos casos mais graves, hemorragias e morte.

Bicho-queima, manduruvá, bicho-cachorrinho, bicho-roseta, bicho-cabeludo… As taturanas têm muitos nomes populares, dependendo das variedades e das regiões. O seu habitat são as matas e, nas áreas urbanas, aparecem em jardins e pomares. Os acidentes geralmente ocorrem por pura distração, em trilhas com estrutura de corrimões, no contato com uma árvore, ou até mesmo ao colher um fruto ou no pisar descalço em área de mata. Após a introdução das cerdas, o veneno é injetado. A dor é imediata e violenta, com sensação de queimação, podendo irradiar-se para outras partes do corpo e provocar ínguas.

Os dois grupos responsáveis por acidentes no Brasil são os megalopigídeos e os saturnídeos. Embora os nomes sejam complicados, existe uma forma simples de diferenciar as taturanas mais, ou menos perigosas, segundo o Instituto Butantan: basta verificar se elas têm ou não cerdas no corpo.  

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Espécie do grupo megalopigídio: as cores vibrantes  e formas variadas atraem o olhar - Valclei Lemos / Arquivo CN

As do grupo megalopigídio são as mais belas e sedutoras e têm como principal característica o corpo peludo e colorido. Estes pêlos ou cerdas, aparentemente sedosos, camuflam uma única glândula venenosa. Quando pressionada, a glândula libera o veneno que percorre um canal até ser injetado na pele humana. Um exemplo é a espécie odalia orsilochus, popularmente conhecida como bicho-cachorrinho. O contato com este animal resulta em dor intensa, com sensação de queimação. 

Quem passou por essa situação recentemente foi a apresentadora Sandra Annenberg. Ela pisou em um exemplar da espécie e, sem saber do que se tratava, postou um vídeo em sua rede social no qual perguntava a seus seguidores:  “Alguém sabe que bicho é esse? Pisei nele e meu pé está pegando fogo! Uma dor insuportável! Socorro!”. A postagem teve mais de 5 mil comentários. 

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Espécie do grupo saturnídeo: atenção deve ser redobrada -  Valclei Lemos / Arquivo CN

Os saturnídeos, por sua vez, à primeira vista já espantam. São espinhosos e, consequentemente, mais venenosos. Suas cerdas são semelhantes a “pinheiros” com glândulas de veneno no ápice. Caso pressionados, injetam o veneno na pele. A gravidade depende do número de cerdas envolvidas no acidente. O grupo inclui as lagartas do gênero lonomia, que têm maior relevância médica pois podem ocasionar acidentes graves e até a morte.

A mais perigosa

Chamadas de taturanas assassinas, a espécie lonomia é uma exceção no mundo das taturanas. Da família saturniidae, possui uma toxina responsável pela coagulação sanguínea chamada de síndrome hemorrágica. O contato com os espinhos provoca hemorragias internas e externas, que podem ser brandas, graves ou gravíssimas, dependendo da sensibilidade da pessoa e da quantidade de veneno injetado.

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Espécie lonomia, a mais perigosa, vive em bandos - Acervo Instituto Butantan

Sem socorro médico a vítima pode morrer de hemorragia cerebral ou insuficiência renal aguda. A espécie ocorre em todo o Brasil e durante todo o ano. Com maior número de acidentes no verão - no sudeste entre janeiro e abril.


Como agir em caso de acidentes

Recentemente, o Butantan pubicou material em sua página na qual consta que, cerca de 5 mil acidentes com diversos tipos de lagartas ocorrem anualmente no Brasil. Desses, 500 a 1.000 são provocados por lagartas do gênero lonomia. 

Na postagem, a diretora técnica de produção de soros do Butantan, Fan Hui Wen, explica que em caso de acidente é importante manter a calma e fazer o reconhecimento pelas características do animal. “Para as lagartas peludas, a indicação é lavar e realizar compressa gelada no local do contato e procurar uma unidade de saúde caso a dor seja intensa. Já se o acidente for com uma espécie do tipo “espinhudo”, tente tirar uma foto do exemplar e siga para uma unidade de pronto atendimento, onde os profissionais de saúde devem buscar a confirmação se o acidente foi ou não provocado por lonomia".

Em casos positivos, de acordo com o Butantan, inicia-se então uma série de protocolos para acompanhar a evolução do quadro. O primeiro passo é realizar uma coleta de sangue e verificar a coagulação do paciente. Mesmo que esteja tudo certo, o recomendado é que a pessoa permaneça em observação entre 6 e 12 horas. Se houver alterações que indiquem que há envenenamento sistêmico no período, é feita a administração do soro antilonômico, que neutraliza os efeitos do veneno – são ministradas cinco ampolas para quadros moderados e dez, para graves.

“O que pode acontecer é a pessoa encostar numa lagarta, não saber que se trata de uma lonomia e procurar atendimento muitas horas ou dias depois, com situações bem agravadas”, alerta Fan, na postagem. 

Os sintomas iniciais são dor e queimação, irritação local, vermelhidão e inchaço leve. Depois, algumas pessoas podem apresentar dor de cabeça, náuseas e vômitos, seguidos por sangramentos na gengiva, nariz e urina, além do aparecimento de manchas arroxeadas pelo corpo. Esses são sintomas extremamente preocupantes e indicam a necessidade imediata de atendimento médico.

O soro

Na década de 1990 a espécie lonomia causou seis mortes e 1.800 acidentes no sul do país, na cidade de Passo Fundo. Acionado, o laboratório de Parasitologia e Entomologia do Butantan iniciou pesquisas que resultaram, a partir de 1994, no soro antilonômico, único no mundo feito a partir do veneno da lonomia.  O soro, que salvou vidas, inclusive na Colômbia e Argentina, é distribuído pelo Ministério da Saúde nas regiões Sul e Sudeste, onde ocorre o maior número de acidentes, e desde o início de sua produção não foram mais registrados casos de morte. De acordo com o Instituto Butantan, atualmente, são produzidos e entregues ao governo federal cinco mil frascos-ampolas por ano.

Características da lonomia oblíqua

lagarta lonomia
Valclei Lemos / Arquivo CN
  • Colorido em geral marrom
  • Cerdas em forma de pinheirinho
  • Manchas brancas em forma de “U” no dorso
  • Hábitos gregários (vivem em grupos de até 80 indivíduos)
  • Possuem de 7 a 8cm de comprimento

Ao encontrar este inseto, não mate, apenas evite o contato.

Mariposas e borboletas

Taturanas e lagartas são, na verdade, a mesma coisa. São as denominações populares da fase larval de desenvolvimento de um lepdóptero, ou seja, mariposas e borboletas. As duas têm o mesmo ciclo de vida: quando adultas soltam os ovos, que evoluem para as larvas. Depois de cerca de dois meses de vida, as larvas transformam-se em pupa para, após a metamorfose, chegar à fase adulta, um inseto alado que tanto pode ser uma mariposa, de hábitos noturnos, ou uma bela borboleta. Tem início, então, mais uma temporada de acasalamentos para iniciar um novo ciclo evolutivo. É o milagre da vida.

Em outras palavras, as larvas de mariposa são taturanas com estrutura de cerdas transmissoras de venenos, das famílias megalopigídeos e saturnídeos. Já as das borboletas, são as lagartas lisas, das famílias limacodidae e arctidiae. A maioria não possui venenos.

Eleni Nogueira

Eleni Nogueira

Jornalista formada em Comunicação Social pela Universidade Braz Cubas

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